Quando
o público leigo fala sobre magia, invariavelmente surge a velha
classificação, a qual separa a magia branca da magia negra. Na
realidade, o público que não é leigo, e que já tem algum contato com o
tema da magia, também muito frequentemente estipula a divisão entre os
dois tipos essencialmente diferentes. Algumas pessoas, para deixar o
tema ainda mais complexo, utilizam-se do termo “magia cinza” para se
referir a um tipo que não tem um propósito de causar o mal mas que, por
efeito colateral, pode causar o mal. E há também aqueles que definem a
magia simplesmente como algo neutro, que não é intrinsecamente nem
branco, nem negro, embora eu acredite que esta seja talvez uma forma de
se evitar ter que lidar com as implicações desta questão.
Porém
como poderíamos definir de uma forma mais precisa o que qualifica estes
lados, branco e negro? A definição mais simples é que o lado branco faz
o bem, e o lado negro faz o mal. Diz-se que o motor de toda magia é o
desejo. E eu acredito que o seja de fato, pois é do desejo que vem a
“força inicial”, ou a “energia”, de uma operação mágica. Deve ser por
isso que geralmente a motivação (o desejo) para realizar algo para os
outros, ao invés de si mesmo, é considerada como branca. Ao passo que o
desejo de realizar algo para si, ao invés dos outros, é considerado por
muitos como magia negra. Se acreditarmos que essa contradição é real
(entre si mesmo e os outros), isso parece justificar conceitos de magia
que não estão relacionados a benefícios pessoais, às vezes nem mesmo a
resultados, limitando-se a uma pacificação interior com intuito de
tornar-se mais harmonioso em si mesmo e em relação ao mundo.
Harmonizar-se
é um objetivo belo, mas não é magia. Pessoalmente, eu considero a magia
como a arte de tornar-se criador de sua própria vida, tanto
internamente, como externamente (é claro que o caminho de um mago sempre
começa pela via interna, o que é a criação da base sobre a qual todo
seu trabalho criativo estará fundamentado). Porém, pensando assim, se é
forçado a enfrentar este aparente paradoxo entre a realização de si
mesmo e a realização dos outros. O mago então precisa resolver este
conflito, ou contentar-se em ser um mago negro. A respeito da opção de
ser um mago negro, pessoalmente eu não acredito que alguém seja
realmente feliz optando por ela. Afinal todo ser humano tem sentimentos
e, por mais que os neguemos, por mais que possamos querer deixá-los
sedados, eventualmente nossa capacidade de adormecê-los se esgota e
precisamos enfrentá-los, ouvindo aquilo que nos cobram.
A
outra opção é ser um mago branco, sendo mago por tornar-se criador de
sua própria vida, e sendo branco pela busca de fazer o bem. Mas como ser
si mesmo, como expressar a si mesmo, realizando-se, sem ser egoísta?
Uma ideia que me parece muito útil nesse sentido é separar dois
conceitos: um é o desejo em si (do que se busca realizar), e o outro é o
“como” se pretende realizar. Vou tomar um exemplo que parece ser
egoísta: “tornar-se rico”. Certo, a riqueza parece ser um objetivo
egocêntrico para muitos, afinal ser rico pode significar tirar esta
mesma riqueza dos outros e concentrá-la em si. Mas, se pensarmos bem, há
várias formas de riqueza lícita no mundo, nas quais nós oferecemos
nosso dinheiro espontaneamente. Nós temos diversos nomes de empresas,
como Disney, Coca-Cola, Google, Microsoft, Yahoo, Apple, e outros nomes
associados à riqueza. Assim, tornar-se rico não é um objetivo egoísta
quando se oferece algo especial, quando se tem um papel central.
O
erro, portanto, não está no desejo em si, e sim em como se pretende
realizar o desejo. Ter consciência da diferença entre “o que” realizar e
“como” realizar é algo fundamental. Frequentemente desejamos alguma
coisa e também queremos impor o “como” irá acontecer, quando a atitude
correta é deixar livre a resposta do mundo que nos cerca. Nâo é a
realizaçao rápida e frágil que se deve procurar, e sim a realização
estruturada e forte. Frequentemente, quando queremos nos impor à força,
podemos até conseguir um resultado rápido, mas será fora de contexto,
sem raízes e com laços imaturos entre pessoas imaturas. Por outro lado,
se permitirmos que o mundo aja de acordo com seu próprio ritmo e
natureza, as ações serão graduais, muitas vezes pausadas, porém serão
diversificadas (plurais), gerando contextos cada vez mais completos, com
raízes cada vez mais sólidas, entre pessoas maduras unidas por laços
também maduros.
Para
um mago, este não é apenas um modo de agir externo, mas também interno
no que diz respeito à realização da própria magia. No que se refere às
ressonâncias internas do mago com a realidade invisível, estas também
não surgem com a força. Estas relações internas precisam ser também
cuidadosamente cultivadas.
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