Quantas
vezes acontece de se apresentarem, diante de nós, respostas para a
vida? E cada uma delas é apresentada como a única resposta certa,
invalidando todas as outras. Depois de um tempo, quem nos deu a resposta
muda de ideia, como se aquela ideia perfeita não mais valesse, e então
nos oferece uma nova, perfeita de novo. Há tantos que se oferecem com
respostas perfeitas que nem sabemos por onde começar.
Estamos
recebendo um verdadeiro bombardeio de respostas, sem termos sequer
formulado uma pergunta. Apenas aproximam-se de nós e dizem “Eu tenho a
resposta para sua vida”, e então se dissermos “Você conhece a minha
vida?”, simplesmente nos tratam como se não importassem nossas
particularidades pois, quaisquer que elas sejam, estão presumindo que a
resposta oferecida é perfeita. Caso realmente provemos que nossas
particularidades não se ajustam à resposta (o que tornaria a resposta
inadequada), nos é dito que não é a resposta que é inadequada, e sim nós
que o somos. Nós que não pegamos o X da questão e, portanto, deveríamos
ouvir mais e falar menos.
Entramos
assim, sem querer, em um jogo de hierarquias onde existem aqueles que
têm mais acesso à uma pressuposta verdade e que estão em uma posição
natural de líderes, e também existem aqueles que apesar de indígnos de
ter acesso a verdades tão maravilhosas, têm a oportunidade (a sorte) de
ter a benevolência dos superiores, e que fariam muito bem se
deixassem-se guiar submissos, ao invés de ficarem fazendo perguntas
irrelevantes que só tiram as pessoas do propósito verdadeiro. É assim
que as pessoas se deixam influenciar. É assim que pessoas conscientes se
transformam em uma massa humana, muitas vezes sendo comparadas a um
grande e imenso gado.
Particularmente,
essa massa humana se forma principalmente em situações de opressão.
Parece que quantos menos você tem, quanto mais difíceis as condições de
realização no mundo, mais suscetíveis as pessoas são de pensarem de uma
forma diferente. É nesse momento que as pessoas podem ser manipuladas a
acreditarem em algo que, em outras condições, não acreditariam. Há um
lado positivo nessa condição, quando chega a abrir nossas mentes e até
mesmo nos conduz a uma autêntica experiência mística (veja o post A Bíblia e a Experiência Mística,
que explora esta condição), a qual é uma experiência de contato consigo
mesmo, encontrando, em si, o divino. Mas também há o lado negativo, que
é sermos mais facilmente manipuláveis nestas condições. Como exemplo
negativo está o nazismo,
no qual o povo alemão deixou-se levar por uma ideologia de ódio e
preconceito, justamente porque estavam desacreditados dentro de uma
grave crise econômica.
As pessoas, quando tomam atitudes nessas condições, tendem a mudar suas crenças devido ao fenômeno da dissonância cognitiva.
A dissonância cognitiva, em linhas gerais, é nossa tendência a
ajustarmos nossos valores e crenças quando fazemos algo que consideramos
inaceitável, de forma que passamos a aprovar nossos próprios atos, os
quais deixam de ser incompatíveis com nossa nova forma de pensar e
acreditar. Quanto mais gritante for a incompatibilidade entre nossas
atitudes quando comparadas às nossas crenças e valores, maior é a
dissonância cognitiva, e maior o ajuste nestas mesmas crenças para que
sejamos capazes de nos sentir melhor, sendo esta uma transformação muito
mais profunda do que uma mera mudança de atitude.
Este
fenômeno acontece, com grande frequência, no âmbito da religião. A
religião, embora tenha uma conotação de religar-se ao divino (o post Quando Tudo é Divino: Um Universo sem Criador e sem Criatura
explora esta conotação), não têm este sentido quando representada pela
grande maioria das religiões que existem no mundo atual. Na verdade,
nestas religiões costumam ocorrer grandes massas de pessoas submissas a
hierarquias de controle, ao invés de haver pessoas verdadeiramente
conscientes. Estas religiões se valem amplamente da dissonância
cognitiva para plantarem dentro das pessoas os seus dogmas, de forma que
as pessoas já não precisam mais ser controladas, pois controlam a si
mesmas. Mesmo quando a sociedade não vive situações opressivas, as
religiões também conseguem exercer influência sobre as pessoas pois,
quando um indivíduo destoa da maioria, a ação desta maioria se torna
opressiva por ser baseada em julgamentos de valores morais (ou seja:
padrões de certo ou errado, pertinentes à cada crença). Como tratam-se
de hierarquias de controle, com diversas ramificações, existem
diferenças de status entre as pessoas, uma desigualdade entre os
indivíduos e, embora haja um grande moralismo inerente à cada religião,
pouco existe de ética, uma vez que a ética é fundamentada na igualdade.
As
pessoas frequentemente se encontram dentro desse processo sem que o
percebam. De fato, compreender esse processo ocorrendo é o passo inicial
para nos descondicionarmos dele e começar a agir verdadeiramente com
consciência na própria vida. É uma transformação que começa pela análise
dos atos, e então das atitudes, e prosseguindo cada vez mais para
dentro de cada um, até o questionamento das próprias crenças (o qual
pode ser dolorido). Para fornececer alguns insights, há os posts Modelando as Próprias Crenças (o qual pretende ajudar a começar este questionamento), Libertando a Si Mesmo (que tem enfoque na liberdade de pensamento, intrínseca a todo ser humano) e Questionando a Definição de Deus,
o qual procura quebrar algumas visões que são aceitas comumente, embora
sejam incongruentes entre si e, mesmo assim, não são questionadas (este
último post tem um enfoque proposital em quebrar crenças e pode causar
uma certa desorientação a princípio).
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